Critérios Jornalísticos ou...a falta dos mesmos!!!

Os "critérios jornalísticos" em Portugal valem, realmente, ...zero!!!

No entanto, existem excepções! 


Poeira de Democracia

Rui Rangel, Juíz-Desembargador

Carlos Alexandre, juiz de instrução do chamado "processo dos submarinos", disse, no despacho que mandou para julgamento os arguidos, que "sabia o que arriscava por decidir nestes termos e que estava a ser alvo de ameaças graves e de escutas ilegais". Disse mais: "Nasci ignorado e quero morrer sério e honrado, pretendendo merecer o respeito dos meus concidadãos."
É bom lembrar que Carlos Alexandre é juiz em Portugal e que estes factos se passaram em Lisboa. Não é juiz na Venezuela, Colômbia ou Birmânia. Mas juro-vos que o seu relato fez-me pensar que se tinha transferido para um desses países, com uma história, também, de submarinos. Mas não, é o nosso juiz Carlos Alexandre, em carne e osso, aquele que quer morrer sério e honrado. Não sei se a poeira em que se transformou a nossa democracia o vai deixar morrer com esta consciência cívica e moral. Bem sei que o caso dos submarinos atinge gente importante da cena empresarial, políticos e membros de um governo que já se finou.
As escutas falam por si, daí ser difícil perceber como é que nem Carlos Alexandre, homem de têmpera rude, sério e honrado, conseguiu levar a julgamento governantes corruptos, que se passeiam nas televisões a pregar grandes orações. Então as luvas ou contrapartidas pagas pelo negócio dos submarinos só beneficiaram os empresários? Carlos Alexandre tem virtudes e defeitos. Estou à vontade para escrever isto porque já confirmei e revoguei despachos seus. Por incrível que pareça foi mais importante a entrevista de Carlos Silvino, sobre o caso Casa Pia, do que o que disse Carlos Alexandre, sobre matéria que nos leva a perguntar em que sociedade vivemos.
A comunicação social foi atrás de Carlos Silvino e deixou Carlos Alexandre a falar sozinho. A inversão de valores e a falta de consciência cívica é gritante: certamente, é mais importante um arguido dar o dito pelo não dito do que um juiz ser pressionado e ameaçado de morte para não levar a julgamento gente que corrompeu o Estado Constitucional. Por causa do assunto Carlos Silvino fui convidado por todos os órgãos de comunicação social para falar: recusei. Para comentar o que disse Carlos Alexandre nem um convite. Como é possível tamanho silêncio sobre o que disse este juiz sério e honrado? O silêncio dos media e políticos dói e magoa gente de corpo inteiro e de coluna vertebral. É um silêncio de partilha de responsabilidades e cumplicidades. Se não tivesse cumprido a sua função, se não levasse a julgamento os implicados no caso dos submarinos, que, por pouco, afundavam financeiramente o País, tínhamos notícia. A ditadura prendia, matava e mandava matar.
A democracia, refém de gente sem qualidade, ameaça, aterroriza com um cálice de cicuta e mata silenciosamente. É preferível a morte, que morrer aos poucos sem dignidade e honra. Carlos Alexandre, não o super-juiz mas o homem simples e corajoso, fez a sua opção: antes morrer de pé, com seriedade e honra, que morrer aos poucos e curvado aos interesses de gente que, semeando o medo lhe quis corromper a dignidade. Alguma vez nas honrarias do Estado, na distribuição de medalhas, um juiz foi reconhecido por cumprir bem a sua função?
in Correio da Manhã

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