Brincar à Justiça

Excelente coluna de Nuno Rogeiro no JN, que eu subscrevo na integra, ...


Brincar à Justiça


É normal que os cidadãos queiram saber o rumo da vida da comunidade. Tentar entrar nos mecanismos da Justiça faz parte dessa legítima curiosidade.

Há ainda a natural inquirição sobre o "estado da Justiça". Tudo isto é um conjunto de interesses atendíveis, e geralmente protegidos. Outra coisa é a intoxicação da "opinião pública" e a tentativa de usar os cidadãos, a sua massa, ou grupos determinados, para pressionar a Justiça nas suas várias instâncias, do julgamento ao recurso.

No lamentável caso recentemente ocorrido em Nova Iorque, em torno de uma morte aparentemente violenta, e sendo certo que só a Polícia e o responsável pela segurança do hotel viram o corpo, nas primeiras horas, criaram-se logo enredos de "factos", circunstâncias e "descrições" que não foram mais do que especulação e romance negro, muitas vezes com intenções determinadas de desculpa e ataque.

O mesmo para os recentes incidentes em torno da "verdade" de um réu condenado em primeira instância, no caso dito "Casa Pia".

Os acusados foram longamente ouvidos por magistrados de instrução, juristas de formação, antes do julgamento. Não em segredo, numa cela húmida e escura, sob a ameaça de tortura de verdugos boçais, mas com garantias (há quem chegue a dizê-las excessivas), e na presença de múltiplos advogados. Houve acareações, todo o tipo de requerimentos, e possibilidades inúmeras de contraditório, impugnação, contestação, contra-interrogatório, desmontagem de falsidades, argumentos falaciosos ou armadilhas.

Qualquer causídico que ouvisse um depoente - testemunha, arrependido ou réu - vir dizer, depois deste enredo processual paquidérmico, tão custoso para o erário público (e para a paciência de todos), que afinal inventou, mentiu ou foi forçado a mentir, devia sentir-se ofendido e insultado, ou agir com frieza e distância. Não se compreende o entusiasmo e o elogio, incompreensível mesmo numa sociedade que fosse tribal e primária.

E há lugares, num Estado de direito, para julgar a mentira da verdade, ou a verdade da mentira, que tenham relevância criminal. São os tribunais.

Não as televisões, não os sofás das discotecas, nem no velho largo do pelourinho, dos velhos julgamentos populares.

Convém, por outro lado, não brincar com coisas sérias. Numa sociedade decente, a Justiça devia ser uma delas.

Comentários

  1. Estou plenamente de acordo, hoje banaliza-se tudo, por isso não há respeito por nada.

    Beijinhos

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  2. Até o Nuno Rogeiro se auto-banaliza...

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  3. Não percebo, António, em quê que Rogeiro se banaliza?

    Pode aclarar a sua afirmação, please?

    Abraço

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  4. Como estão condenados deviam estar é presos. Assim, andam a brincar com isto tudo. Têm tempo. Eu sei que a lei permite esta situação...

    Um abraço,
    Bom fim de semana,
    FF

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  5. Claro que sim.
    Nuno Rogeiro é um senhor que tem a mania que sabe tudo e de tudo e, por isso mesmo, a sua tendência para o que eu chamo exagero é flagrante.

    Poderemos dizer que são as suas opiniões? Podíamos mas não estaríamos a dizer a verdade.

    As suas ligações com outros tipos de serviços informativos - permita-me que omita quais - por vezes toldam-lhe a razão e fazem com que se sinta "no ar".

    P.S. - Compreendo que este meu comentário possa parecer estranho.
    Mas não é, na realidade.

    Abraço

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  6. António,

    compreendo a sua posição porque é o seu coração a falar em vez da razão.

    Espero que entenda a minha quando me cingi a factos, apenas e só. Às vezes, queremos acreditar em algo porque julgamos que aqueles em quem confiamos não são capazes de "fazer mal a uma mosca", mas a realidade é, muitas vezes, bem diferente.

    Quanto à estranheza do seu comentário, para mim, é algo que não me surpreende pelas razões atrás invocadas.

    Abraço

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  7. Fernando,

    são os tais..."excessos de garantias" dados aos arguidos à luz do novo Código do Processo Penal!!!

    Abraço o fim de semana já foi... boa semana para si!

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  8. A compreensão é mútua, caro Amigo.

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